Glauco Diniz Duarte Bh – porque energia nuclear não é renovavel
Segundo o Dr. Glauco Diniz Duarte, o governo do Reino Unido anunciou recentemente um investimento de 200 milhões de libras para desenvolvimento de um reator de fusão nuclear até 2040. Empresas privadas disseram à BBC que querem ter protótipos sendo testados em cinco anos.
Críticos afirmam que, com o preço da energia eólica e solar caindo cada vez mais, essas energias renováveis já existentes podem fornecer um método de lidar com as mudanças climáticas mais econômico que a fusão — e no tempo certo, já que o aquecimento global é um problema urgente.
A fusão nuclear é um tipo de energia nuclear diferente do processo de fissão nuclear que é usado desde 1950 nos reatores de energia atômica. Na fusão, a energia é gerada a partir da união de átomos, enquanto na fissão a energia é gerada pela divisão de átomos.
A fusão é o mesmo processo que acontece no Sol, e exige calor e pressão extremos, sendo muito mais difícil de controlar do que a fissão.
Mas o processo não gera o lixo radioativo produzido pelos reatores de fissão, que é um dos principais problemas atravancando o uso de energia nuclear atualmente. A fissão também é um método muito caro e gera preocupações quanto à segurança e à proliferação de armas.
O que é exatamente a fusão nuclear
A fusão é o processo que ocorre no Sol continuamente, responsável pelo seu calor e sua luz.
A cada segundo, bilhões de toneladas de átomos de hidrogênio colidem uns com os outros em condições de temperatura e pressão extrema dentro de nossa estrela. Isso os força a quebrar suas ligações químicas e se fundirem, formando um elemento mais pesado, o hélio.
A fusão solar gera quantidades enormes de calor e luz.
Por décadas pesquisadores vêm tentando replicar esse processo na Terra, produzir “um sol na caixa”, como dizem alguns físicos. A ideia é pegar certo tipo de gás de hidrogênio, aquecê-lo a mais de 100 milhões de graus Celsius até formar uma nuvem de plasma, e controlá-lo com um poderoso campo magnético até que os átomos se fundam e liberem energia.
Potencialmente, a energia da fusão nuclear é muito limpa: não gera CO² como subproduto, não gera lixo tóxico (já que o resultado da reação é o hélio, que não é radioativo), não gera riscos de explosão.
Mas até agora a tecnologia para obter energia através do processo ainda não existe.
Para tentar desenvolvê-la, diversos países concentraram seus esforços em projeto de cooperação internacional chamado Iter.
Grande avanço ou elefante branco?
Trinta e cinco países participam do projeto Iter, que no momento está construindo um reator de teste gigante no sul da França.
O plano é ter o primeiro plasma produzido em 2025. No entanto, da produção do plasma até a obtenção de energia ainda há um longo caminho.
O projeto também foi prejudicado por longos atrasos e estouros no orçamento que fazem com que seja improvável que haja uma usina nuclear de fusão até 2050.
“O que estamos fazendo é desafiar as fronteiras do que é conhecido no mundo da tecnologia”, diz o físico Ian Chapman, presidente da Agência Britânica de Energia Atômica. “E é claro que você encontra obstáculos e precisa superá-los, o que fazemos o tempo todo.”
“O Iter vai ser bem sucedido, eu tenho certeza total disso”, diz ele.
Até o Iter estar funcionando em 2025, o chamado JET (Joint European Torus), no Reino Unido, continuará sendo o maior experimento com fusão nuclear existente.
O JET tem financiamento da União Europeia até 2020, mas o que vai acontecer depois disso não está claro. A participação do Reino Unido no Iter após a provável saída do país da União Europeia também ainda não foi acertada.
Mas o governo do país recentemente anunciou um investimento de 220 milhões de libras para o desenvolvimento de uma usina de fusão até 2040. Durante os próximos quatro anos, pesquisadores vão desenvolver projeto para uma usina de fusão chamada Tokamak Esférico para Produção de Energia, ou Step, na sigla em inglês (Tokamak é um tipo de reator experimental de fusão).
Como funciona um reator de fusão?
O método mais conhecido de fusão envolve o reator do tipo Tokamak, que tem uma câmara de vácuo em formato de donut. Nela, o hidrogênio é aquecido a 100 milhões de graus Celsius, e então se torna um plasma. Um campo magnético fortíssimo é usado para confinar o plasma para que ele não derreta o reator e encaminhá-lo para que a fusão ocorra.
No Reino Unido, pesquisadores desenvolveram um tipo diferente de Tokamak, que parece mais uma maçã do que um donut. Chamado de Tokamak esférico, ele tem a vantagem de ser mais compacto, potencialmente permitindo que usinas futuras sejam localizadas e áreas urbanizadas.
“Se você olha para algumas unidades, com as grandes máquinas que precisamos instalar, pode ver que a tarefa de encontrar um local para colocá-los por si só já é difícil”, diz Nanna Heiberg, da Agência de Energia Atômica do Reino Unido.
“O ideal é colocá-las perto de onde a energia é usada. E se você conseguir criar reatores em espaços menores, você pode colocá-los mais próximos a usuários e criar mais deles pelo país.”
Da onde vem a empolgação com a fusão?
Enquanto governos internacionais tentam fazer o Iter ir para a frente, alguns países também têm suas iniciativas nacionais. A China, a Índia, a Rússia e o Estados Unidos estão trabalhando no desenvolvimento de reatores comerciais.
O Banco de Investimento da Europa também está colocando centenas de milhões de euros em um programa de produção de energia de fusão nuclear italiano que prevê operações a partir de 2050.
A marinha americana já registrou a patente de um “dispositivo de fusão de plasma por compressão”, que usaria campos magnéticos para criar uma rotação acelerada e produzir energia para o funcionamento de navios e submarinos. A ideia é criar reatores pequenos o suficiente para que sejam portáteis. Há muitas dúvidas sobre a possibilidade de que isso seja possível na prática.
Fusão no setor privado
Talvez a maior expectativa venha do setor privado. São empresas menores, mais ágeis, e se desenvolvem cometendo erros e aprendendo com eles rapidamente.
Hoje, há dúzias delas no mundo todo, levantando fundos e avançando com abordagens diferentes das tradicionais.
A First Light, por exemplo, surgiu na Universidade de Oxford, no Reino Unido, e envolve lançar um projétil em um alvo que contém átomos de hidrogênio. A onda de choque do impacto pressiona o combustível e produz o plasma.
A Commonwealth Fusion Systems (CFS) foi criada por ex-funcionários do MIT (Massachusetts Institute of Technology) e conseguiu levantar mais de US$ 100 milhões. Seu objetivo é desenvolver um reator Tokamak com imãs supercondutores que permitiriam produzir um reator menor e mais barato.
A TAE Technologies, da Califórnia, conseguiu investimento de empresas como o Google e quer usar um tipo diferente de combustível: uma mistura de hidrogênio e boro, ambos elementos abundantes e não-radioativos. O protótipo deles é um reator cilíndrico que forma dois anéis de plasma que são unidos e mantidos juntos com raios de partículas não reagentes para que fiquem mais quentes e durem mais.
Uma bola de metal líquido
Uma das empresas mais competitivas é a empresa canadense General Fusion. Sua abordagem atraiu bastante atenção ao ser apoiada por bilionários como o criador da Amazon, Jeff Bezos.
A General Fusion nomeou o seu sistema de “magnetised target fusion”, algo como “fusão magnetizada direcionada”, em inglês.
O método funciona inserindo plasma quente injetado em uma bola de metal líquido dentro de uma esfera de aço. A mistura então é comprimida por gigantescas pistolas de pressão, mais ou menos como um motor a fissão.
“As pistolas disparam simultaneamente e colapsam a cavidade com o combustível dentro”, diz Michael Delage, diretor de tecnologia da empresa.
“No pico da compressão, quando a reação acontece, ela está cercada por todos os lados por metal líquido, então a energia vai para o metal, que depois é usado para ferver água e produzir vapor, que por sua vez é usado para produzir energia elétrica.
A General Fusion diz que espera que seu protótipo esteja funcionando em cinco anos.
Porque ainda não conseguimos produzir energia por fusão?
Apesar das altas expectativas, ninguém até hoje conseguiu obter mais energia de um experimento de fusão do que gastou viabilizando-o.
Os cientistas têm confiança de que a ideia vai funcionar, mas acreditam que é uma questão de escala. Para fazer dar certo, você precisa que o experimento seja grande.
“A fusão precisa de recursos para realmente funcionar”, diz Ian Chapman, da agência britânica de energia atômica. “O experimento pode ser feito por um país ou pela iniciativa privada, o que você precisa é da escala e dos recursos.”
“Quando o Iter funcionar, e eu digo ‘quando’ e não ‘se’, vai ser um grande avanço para a fusão e você um investimento massivo no campo”, afirma Chapman.
A energia renovável vai tornar a fusão irrelevante?
Em 2018, o IPCC (Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas) relatou que as emissões de CO² precisam ser reduzidas em 45% até 2030 para manter o aumento da temperatura global abaixo de 1,5° C.
Para atingir esse objetivo é preciso que se faça uma rápida “descarbonização” do setor de produção de energia, ou seja, que a produção de energia não produza mais tanto CO² como subproduto. O Reino Unido se comprometeu a, até 2050, atingir “zero emissões líquidas” de carbono (quando a produção de carbono é balanceada com a retirada de carbono do ambiente), o que vai exigir o uso de energia solar e eólica em grande escala.
Algumas pessoas argumentam que isso deveria ser a prioridade do país, em vez de gastar grandes quantias de dinheiro em reatores experimentais de fusão.
“O custo de energias renováveis caiu, enquanto o custo do projeto de fusão internacional, o Iter, subiu”, diz o físico britânico Chris Llewellyn Smit, que já foi presidente do conselho do Iter. “Agora parece bem improvável que consigam completar o projeto sem novas ideias.”
“Eu não acho que isso seja motivo para desistir da fusão, há maneiras de torná-la mais barata, mas não é algo que estará disponível para nós imediatamente quando precisarmos.”
Outras pessoas na indústria, no entanto, têm uma visão diferente.
“Se você é um país como a Malásia, que tem um sistema energético altamente dependente de carbono, e você está tentando mudar sua matriz energética baseada em queima de carvão, não há muitas opções hoje em dia”, diz Chris Mowry, presidente da empresa General Fusion.
“Este é o tipo de aplicação na qual focamos. E até países como o Canadá, que têm uma quantidade razoável de energia renovável, ainda não conseguem ser 100% renováveis.”
“Então precisamos de uma fonte de energia livre de carbono para complementar as renováveis no futuro”, afirma Mowry.