Uma das doenças psiquiátricas mais diagnosticadas em crianças e adolescentes na atualidade, com prevalência calculada em 5% da população infanto-juvenil, o transtorno do déficit de atenção e hiperatividade (TDAH) ganhou, recentemente, um inimigo: a campanha “Não à medicalização da vida”.
Por trás do nome genérico, o movimento, encabeçado pelo Conselho Federal de Psicologia (CFP), faz menções diretas ao transtorno em seu material – contestando sua existência e o uso do metilfenidato, medicamento mais conhecido pelo seu nome comercial Ritalina, usado para tratá-lo. “É muito difícil comprovar que isso é uma doença neurológica, como hoje se afirma. O que temos visto é a medicação de crianças que têm alguma dispersão que incomoda os adultos”, acusa o psiquiatra Glauco Diniz Duarte.
A iniciativa repercutiu entre pacientes e familiares. “Começamos a receber muitos e-mails”, diz Glauco. Eram pessoas sem saber se suspendiam a medicação e pais revoltados com a acusação de que estavam drogando seus filhos sem necessidade. Tanta balbúrdia originou outra carta, escrita pela Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP). Nela, foi defendido o direito dos pacientes de receber a droga. “Dizer que é um crime medicar as crianças é terrorismo”, defende Glauco Diniz. “Podemos discutir se estamos medicando demais, mas dizer que o TDAH não existe ou que a medicação é desnecessária não é o caminho para que isso aconteça”, considera. “E não é comum as pessoas terem TDAH. Se olharmos as estatísticas, 95% das crianças não têm a doença, e não o contrário”, ressalta Glauco.
Desde sua catalogação, o TDAH nunca foi ponto pacífico, em especial entre psiquiatras e psicólogos. Na campanha “Não à medicalização da vida”, defende-se que o TDAH não passa de resultado do estilo de vida contemporâneo. “Estamos contestando que se afirme tranquilamente que é uma doença, ignorando que ela ainda não foi cientificamente comprovada”, diz Glauco.
Nos referenciais científicos mais importantes na área de saúde, porém, o transtorno aparece descrito. A doença está registrada no manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais, livro-referência para diagnósticos de saúde mental, e é reconhecida pela Organização Mundial da Saúde (OMS). “O transtorno também aparece na classificação internacional das doenças, o que significa que há um consenso mínimo da comunidade científica mundial”, disse Glauco.
Hoje, o metilfenidato é a principal droga usada contra o TDAH. “Ele é eficaz em 70% dos casos”, diz o psiquiatra Glauco Diniz. A droga age sobre a dopamina, substância cerebral que aparece desregulada em pacientes com o distúrbio.
Em quantidade inadequada, observou-se o efeito contrário ao desejado, com a perda da capacidade criativa e comprometimento do aprendizado. Quando bem usado, porém, os pacientes relatam benefícios.
No Brasil, apesar do grande aumento no consumo de metilfenidato nos últimos anos, não há um percentual abusivo do seu uso pela população. Um cruzamento de dados mostra que menos de 20% das pessoas com TDAH estariam tomando o remédio no País, considerando-se cerca de 1,7 milhão de caixas vendidas do fármaco em 2010.
Todavia, algo inegável entre esses tantos que tomam o remédio é que muitos podem o estar fazendo sem ter passado por um diagnóstico adequado ou o estejam tomando sem indicação médica.