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GLAUCO DINIZ DUARTE  Barulho derruba em 20% o preço de imóveis em BH

Imóveis residenciais em áreas barulhentas de Belo Horizonte sofrem desvalorização média de 20%. Os vilões da vizinhança são casas noturnas, igrejas, vias com intenso fluxo de veículos e points de bares e restaurantes, onde é grande a aglomeração de pessoas até altas horas. Além do prejuízo, muitos proprietários enfrentam dificuldades para vender a casa ou o apartamento. A alternativa, diz especialista, pode ser apelar à Justiça. 
Segundo dados da Associação dos Moradores de Belo Horizonte, as regiões com maior intensidade de ruído, hoje, são Pampulha, Lourdes, Savassi, Santa Tereza, Buritis e Coração Eucarístico. 

O presidente da Comissão de Direito Imobiliário da Ordem dos Advogados do Brasil em Minas (OAB-MG), Kênio de Souza Pereira, afirma que imóveis em áreas assim registram depreciação média de 20% no mercado. Mas o baque no bolso pode ser maior. “Chega a 30% em alguns casos”, afirma o corretor de imóveis Fabiano Botelho. 
Segundo ele, a tranquilidade é um fator decisivo para quem busca um novo lar e, por isso, “o barulho dá margem à depreciação”. 

No bairro de Lourdes, por exemplo, é comum encontrar imóveis disponíveis nas ruas próximas aos bares, mas o medo do ruído acaba afastando compradores, diz Lúcia Pinheiro Rocha, fundadora da Associação dos Moradores do Bairro de Lourdes (PróLourdes). 

“Esses imóveis têm menos circulação e fluidez, por estarem próximos de lugares barulhentos. Conheço uma pessoa que estava quase vendendo, mas quando o interessado viu os bares, optou por comprar em outro lugar”, conta, afirmando que, para fechar negócio, alguns proprietários chegam a baixar o valor em 15%, se comparado ao preço cobrado nas ruas paralelas.

“Faixa de Gaza” 
Segundo Lúcia, um dos pontos de maior desvalorização fica na esquina das ruas Alvarenga Peixoto e Curitiba, local apelidado de “Faixa de Gaza” devido aos conflitos recorrentes entre moradores e as casas de entretenimento. 
Um antigo morador desse ponto, que pediu para não ser identificado, colocou o apartamento à venda e há um ano se mudou para uma rua paralela.

“Não conseguia mais dormir, estava atrapalhando a minha vida”. 
Para fechar negócio, ele baixou o preço do imóvel, avaliado em R$ 850 mil, para R$ 750 mil. “Quem não fez isso está com o apartamento parado até hoje”. 

TRÂNSITO
​Dona da corretora Marccar Imóveis, Carmen Oliveira está com dois imóveis “encalhados” há quatro anos devido ao excesso de barulho de veículos. Os apartamentos ficam na rua Rio Grande do Norte e na avenida Barão Homem de Mello. 

“Muitos clientes se interessam, mas desistem por causa dos carros. A venda é mais difícil, então precisamos criar estratégias para atrair o comprador, já que ele terá o ônus de conviver com a poluição sonora”, avalia, lembrando que os imóveis poderiam ter sido vendidos em um tempo médio de um ano se estivessem em um ambiente mais tranquilo.

Vice-diretora de uma escola de ensino fundamental, Carmem Lúcia Lacerda Borges teme a desvalorização da casa que adquiriu há 17 anos no bairro Santa Branca, na Pampulha. 

Atraída, na época, pela tranquilidade da rua arborizada e com pouco trânsito de veículos, ela vem enfrentando uma verdadeira tortura há três anos, com a instalação de um depósito de materiais de construção nas imediações. A educadora relata movimento de tratores e um “entra e sai” constante de caminhões do local. “Não temos sossego. Durante todo o dia e madrugada o barulho é insuportável”. 
Carmem Lúcia ainda não cogita colocar a casa à venda, mas pretende fazer um abaixo-assinado com os moradores para tentar tirar a empresa do local. “Se eu tiver que vender, tenho medo de não conseguir. Até porque se fosse comprar hoje, ofereceria um preço bem mais baixo por causa do barulho ou até deixaria de comprar”, afirma. 
Para Kênio Pereira, recorrer à Justiça pode ser a opção mais vantajosa para quem se sente prejudicado pelo barulho excessivo. 

“Quando é um estabelecimento comercial, é ele que precisa se adequar às normas e às leis da cidade. É mais rentável os moradores investirem no enfrentamento do problema, tomando providências jurídicas, do que tentar vender o imóvel a um preço mais baixo”, afirma, ressaltando que, no caso de prédios em que todos os moradores se veem prejudicados, o próprio condomínio pode arcar com as custas jurídicas. 

Segundo o especialista, as leis municipais são rigorosas e as denúncias são essenciais para que a fiscalização penalize ou feche o estabelecimento que desrespeita a população. 

“Muitas casas de festas, por exemplo, burlam o isolamento acústico, que é uma obra cara, para conseguir um alvará fraudulento. Nesses casos, os vizinhos podem reclamar e exigir que o estabelecimento se adeque ou feche”, explica. 

Multa por desrespeito ao silêncio chega a quase R$ 57 mil
A multa para os estabelecimentos que infringirem a lei silêncio pode chegar a R$ 56.375,37, segundo a Secretaria Municipal de Política Urbana da Prefeitura de Belo Horizonte. Em casos extremos, o comércio pode ser até fechado. No ano passado, segundo o órgão, foram registradas 9 mil reclamações relacionadas à poluição sonora promovida por bares, boates e casas de shows (entre 65% e 70%), templos religiosos (7,5%), comércio em geral (3% e 5%) e construção civil (2% e 4,5%).

Em 2016, após intensas negociações que não deram resultado, a Associação dos Moradores do Bairro de Lourdes (PróLourdes) conseguiu o fechamento de uma casa noturna que perturbava o silêncio na região.

“Conseguimos medições sonoras consecutivas que mostravam o barulho excessivo, apresentamos os documentos para a prefeitura, abrimos um processo administrativo, encaminhamos ao Ministério Público e conseguimos impedir a renovação do alvará de funcionamento”, conta Lúcia Pinheiro Rocha, fundadora da entidade. Hoje, no local, funciona uma agência bancária. 
Lúcia Pinheiro considera o bom-senso como a chave para que estabelecimentos comerciais e moradores convivam em harmonia. “Muitos até gostam de sair de casa, ir a um bar ou restaurante ali perto, mas se esse local coloca uma música alta até meia-noite, perturba a ordem e desvaloriza o seu imóvel, ele se torna hostil”, enfatiza. 

Vantagens

A vice-presidente das Administradoras de Imóveis da Câmara de Mercado Imobiliário e do Sindicato das Empresas do Mercado Imobiliário de Minas Gerais (CMI/Secovi/MG), Flávia Vieira, avalia que a concentração comercial pode até trazer vantagens mercadológicas. 
“Um exemplo é na rua Pium-í, no Sion, que é quase completamente tomada por bares e restaurantes, mas ainda tem casas residenciais. Os moradores convivem com um barulho enorme, mas seguramente quando decidirem vender conseguirão bom preço, pelo ponto comercial que a casa representa”, afirma. 

Ela destaca também que o que vai determinar a compra são as prioridades de cada cliente. “Há quem queira, por exemplo, morar em uma região em que haja muitos serviços, padaria, escola, farmácia, sacolão. É provável que essa pessoa não exija que o local seja silencioso”, diz.

 

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