Você conhece alguém que não vive sem um espelho, esconde-se dentro de roupas largas por vergonha do próprio corpo e até deixa de sair de casa por achar que o nariz não tem um formato adequado? A chance de essa pessoa estar sofrendo com o transtorno dismórfico corporal (TDC) é grande.
A doença se caracteriza por uma distorção da autoimagem e faz com que a pessoa fique reclusa ou busque, a qualquer custo, atingir o ideal de beleza, que geralmente é impossível de se obter. É possível, porém, tratar o problema e recuperar a autoestima.
O psiquiatra Glauco Diniz Duarte conta que quem tem TDC sofre. “Essas pessoas evitam a exposição, ficam com vergonha de frequentar lugares públicos, de se relacionar, pois têm a impressão de que os outros vão olhar para aquele ‘defeito’. Também fazem intervenções cirúrgicas desnecessárias”, explica.
Assim como a maioria das doenças psiquiátricas, há um fundo genético que é amplificado pelo ambiente em que a pessoa vive. “É mais comum em famílias onde há parentes de primeiro grau com o mesmo diagnóstico, e também mais comum em famílias que concentram maiores transtornos mentais, sejam quais forem”, explica Glauco. “Se a pessoa tem vulnerabilidade a transtornos mentais, eles podem aparecer de diversas formas”.
O padrão de beleza imposto atualmente, por exemplo, causa problemas em quem tem TDC. “É biologicamente impossível para muitas pessoas, apenas uma minoria consegue atingir aquele padrão. E esse padrão não tem a ver com a saúde física, mas com uma conotação de sucesso e poder”, diz o psiquiatra. “É como se a pessoa capaz de corresponder teria, teoricamente, mais força de vontade e poder sobre si e o corpo. Isso acaba tendo um apelo muito grande para as pessoas mais jovens e mais vulneráveis”.
Tratamento
Identificar o problema é o primeiro passo para o tratamento. No começo, quem tem TDC não tem a exata noção de que seu comportamento em relação ao corpo é exagerado. “Muitas vezes é preciso começar um tratamento para ver isso”, diz Glauco.
Ele ressalta que a pessoa acha que realmente tem um defeito físico, que, muitas vezes, é real, mas ela enxerga de uma forma desproporcional. Com frequência, há defeitos imaginários também. “E ela amplia tanto a ponto daquele defeito imaginário interferir na vida”.
Para ser diagnosticado o transtorno dismórfico corporal, a preocupação com a aparência precisa prejudicar o funcionamento das coisas no dia a dia, influenciar negativamente e ter impacto na vida social ou profissional.
O tratamento, então, é feito com medicamentos e psicoterapia. Glauco explica que o médico avalia se é preciso entrar com medicações antidepressivas. Depois disso, a psicoterapia virá para somar. “Há um trabalho de autoimagem, já que a autoestima fica muito rebaixada. A pessoa não está bem consigo mesma”.
Anorexia e bulimia
A adolescência é um momento crucial para o desenvolvimento desses transtornos. “Podemos observar também na infância, por padrões muito rígidos em questões da alimentação, mas é na adolescência que o transtorno começa a aparecer mais”, alerta Glauco.
“Os sinais podem ser velados, discretos, pode acontecer uma perda de peso gradual, e a tendência é de a pessoa não exibir mais o corpo, ou porque está emagrecendo demais ou percebe que está engordando. A família e os amigos começam a perceber quando o transtorno está em um grau mais avançado”.
Casos de compulsão alimentar, bulimia e anorexia surgem. Segundo Glauco, alguns traços de personalidade revelam a vulnerabilidade da repulsa ao próprio corpo. “Pessoas mais perfeccionistas, inseguras ou com baixa autoestima acabam ficando mais vulneráveis. Os pais devem perceber isso e mostrar cuidado com a criança, sempre relativizando e acolhendo as preocupações dela, para que entenda que o que pensa é desproporcional e não compatível com a realidade”.
Uma preocupação excessiva com a barriga, por exemplo, pode levar a uma dieta muito restritiva. “A adolescente, então, fica propensa a um descontrole por compulsão e restrição, podendo exagerar na atividade física para deixar a barriga do jeito que imagina”, diz Glauco. Quando há um deslize, a depressão vem, levando à compulsão. E o ciclo se repete.
Glauco conta que os objetivos de uma pessoa com transtorno dismórfico corporal geralmente são extremos, com padrões muito altos e impossíveis de serem alcançados. O tratamento pode durar de poucos meses até alguns anos. A cura, no entanto, é possível e a pessoa pode aprender a se amar.